Segundo a professora, a ideia de trazer a música para a sala de aula vem ao encontro de que ela é parte do estudante. “Ele é cor, movimento, som, ritmo, ou seja, estão inscritos nele todos os aparatos culturais que circulam em nossa sociedade polifônica. E, enquanto professora de Língua Portuguesa, não posso restringir a tão ampla dimensão, a que estamos submetidos culturalmente, apenas a textos verbais, enquanto outros textos estão no ar”, explicou Rita.
Sobre o foco nas músicas com nomes de mulheres, a professora disse: “Decidi por trazer a música à minha sala de aula e unir esta linguagem à temática de gênero, tentando, assim, uma melhor compreensão dos papéis destinados ao gênero feminino, em um espaço de tempo de aproximadamente sessenta anos”.
Rita disse também acreditar que as músicas são obras estéticas, capazes de expressar sentimentos dos seus criadores, revelando, assim, suas experiências e vivências. E ao aluno coube analisar o papel das mulheres retratadas na música e seu contexto social:
– A partir da música, as discussões ganharam um contexto histórico, expressando a compreensão da relação do jovem com o mundo e, acima de tudo, a sua capacidade de interpretação crítica do contexto histórico, social e cultural de diferentes épocas e contextos históricos – disse Rita.
O projeto: Amélia, Natasha, Anna Júlia e outras mulherices da música
Como primeira ação do projeto, a professora solicitou aos estudantes que trouxessem músicas com nomes próprios de mulheres, buscando sempre o seu contexto histórico e situacional. Após a escolha das músicas, o projeto continuou com outras etapas: os alunos tiveram que utilizar a percepção, para ver realmente como a mulher está sendo mostrada, analisaram o contexto histórico e cultural da época, procuraram os sentidos implícitos nas letras, dialogaram acerca das temáticas e produziram textos verbais e não verbais.
Sobre os textos verbais e não verbais construídos, a professora conta que pediu tarefas como: escrever uma narrativa, contando como está “Natasha” nos dias atuais; escrever uma carta, dando conselhos de esperança à “Janaína”; realizar campanha, em texto misto, contra a violência doméstica sofrida por “Camila”; pesquisar e expor como era o biquíni de “Ana Maria” e como são os biquínis hoje; escrever uma poesia de “Joana”, respondendo às provocações de Ana Carolina; criar uma história em quadrinhos, dando um novo rumo à vida de “Clarisse”; e traçar um paralelo entre “Amélia” e “Maria”, construindo um parágrafo dissertativo.
E o encerramento do projeto, que aconteceu na manhã de ontem (17), não poderia ser diferente: os alunos puderam conferir um pocket show do músico Maurício Terra, que interpretou todas as músicas que os alunos trouxeram para sala de aula.
– Esse foi um espaço de interação e descontração entre todos os protagonistas do projeto e, ao mesmo tempo, de reflexão – enfatizou Rita, sobre o pocket show que encerrou o projeto.
Alunos:
Ainda tem machismo, sim!
Marcela Farias, de apenas 12 anos, deu uma aula sobre igualdade entre os sexos e contou o quanto adorou o projeto:
– Conseguimos ver grandes mulheres através dessas músicas, algumas mais tristes, outras que falam de amor, mas, em todas, conseguimos refletir sobre o poder das mulheres. […] o projeto foi muito importante, porque fez com que os meninos também parassem pra refletir sobre a importância de respeitar as mulheres – disse Marcela.
E, quando perguntada se existia machismo dentro do ambiente escolar, Marcela concordou e disse:
– Eles têm que aprender a cultura da mulher, crescer e virar homem de verdade. Todos devem aprender que ninguém é melhor que ninguém, antes, o homem achava que podia mandar na mulher e dominar a mulher. Mas isso era antigamente, agora, o tempo mudou, nós [mulheres] estamos atrás de igualdade! – explicou a estudante de apenas 12 anos.
A estudante Yasmin Moura contou que o projeto foi bom para refletir sobre o real valor das mulheres:
– Foi um trabalho muito bom, pra todos aprenderem a valorizar a mulher, tem muita mulher que faz tudo, trabalha, limpa a casa e, muitas vezes, faz papel de mãe e pai dos filhos – explicou.
Sobre a aceitação do projeto por parte dos colegas homens, Yasmin disse: “Foi ótimo, mesmo nessa idade, tem muitos machistas, e o projeto fez com que eles pensassem sobre a mulher”. A simpática menina ainda concluiu dizendo que adora projetos criativos como esse: “É muito legal quando o professor faz algo diferente, ano passado fizemos um livro, é muito bom estudar desse jeito”, concluiu.
O estudante Roger Chaves, de 12 anos, aprovou o projeto e, apesar de achar que existe, sim, machista, não se considera um:
– Eu achei muito legal, porque é legal falar das mulheres, é como uma homenagem. Vimos músicas que falavam bem, falavam mal, algumas machistas, e foi muito importante debater sobre isso. A metade das músicas que analisamos eram machistas, isso é muito alto – reflete Roger.
Eduardo Pontes, de 13 anos, disse que o projeto foi útil para refletir sobre o olhar das pessoas sobre as mulheres. “A gente pode ver o jeito do outro olhar para a mulher, antes, bater numa mulher não era crime, o mundo era muito machista e, aos poucos, está melhorando. Com o projeto, vimos que esse assunto é muito sério e que não é brincadeira, temos que parar para pensar”, concluiu.
Emily Camargo, de 12 anos, contou que dentro da própria sala de aula existem colegas machistas. “A gente aprendeu que ter que debater sobre esse assunto, não é legal continuar do jeito que está. Aqui mesmo, dentro da sala, tem meninos machistas, isso começa desde pequeno. Falta muito pra ficar tudo igual, muitos ainda acham que são melhores”, explicou.
Maria Eduarda, de 12 anos, teceu elogios à iniciativa da professora Rita e ao show de Maurício Terra, e concordou com a colega Emily, relatando que sofre diariamente com o machismo:
– É muito importante um projeto como esse, pra debater o machismo dentro de aula também, hoje em dia, ainda existem meninos que acham que a gente não pode fazer certas coisas. Por exemplo, eu adoro jogar futebol, e eles não me deixam jogar, me chamam de perna de pau! Pra eles, a gente não pode fazer nada, eu fico muito irritada– desabafou a corajosa Maria Eduarda.
Por Esther Louro
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